Você sabe qual foi a maior sensação da NAB?

Nº 132 – Abril 2013

Por André Barbosa Foto: Divulgação

ENTREVISTA

Não é preciso explicar para ninguém porque as ações do Ministério das Comunicações influenciam diretamente a vida de todos os profissionais que trabalham no mercado de radiodifusão. É por meio dele, e de sua agência regulamentadora, a Anatel, que o governo regulamenta, controla e fiscaliza todas as atividades que envolvem a transmissão de dados de um emissor para um receptor dentro do território brasileiro.
À despeito disso, as duas entidades andavam quietas. Com a migração da prioridade da agenda governamental da TV Digital para a Banda Larga, muito mais preocupadas estavam as companhias telefônicas e provedoras de serviço de internet. Porém, bastou o anuncio da Portaria 14 de 2013, ocorrido no passado dia 7 de fevereiro, para que a atenção dos broadcasters voltasse radicalmente em direção aos órgãos governamentais.
Nela, o Ministério autorizava a Anatel a dar prosseguimento à seção da faixa dos 700 MHz, outrora dedicado à transmissão dos canais da rede pública de televisão, às “Teles” para a implantação de tecnologia 4G seguindo as diretrizes do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL).
Muita especulação se fez sobre o assunto. Houve quem levantou a impossibilidade de fazê-lo, outros sobre as interferências que as redes gerariam entre si e ainda quem culpasse pressões relativas à vinda da Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016 como fatores determinantes, em detrimento do bem estar nacional. A resposta do governo foi colocar a proposta em consulta pública, procurando ouvir diferentes setores da sociedade sobre como seria a melhor forma de fazer esta transição.
Por trás de toda esta polêmica repousa a figura do atual Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo Silva. O Ministro nasceu em 10 de março de 1952 na cidade de São Paulo, SP, foi eleito Deputado Federal pelo PT do Paraná para a primeira legislatura de 1991 a 1995. Foi reeleito, em 1994, para o segundo mandato, no qual foi vice-líder do PT e presidente da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara Federal.
Em 1999 assumiu o cargo de Secretário de Fazenda do Estado do Mato Grosso do Sul, onde permaneceu até o fim de 2000. Foi ainda secretário de Fazenda do município de Londrina, PR, de janeiro de 2001 a março de 2002.
Em 2002, foi eleito para o seu terceiro mandato, ocupando cargos de destaque na Câmara Federal. Foi, novamente, vice-líder do PT e presidente da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização. Licenciou-se em março de 2005 para assumir o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Em 1º de janeiro de 2011, tomou posse como ministro das Comunicações.
A Revista da SET conversou com o Ministro sobre o Switch-Off da TV analógica, as novas barreiras da TV Digital, o Plano Nacional de Banda Larga, 4G e, claro, sobre a polêmica transferência de faixa de frequências.

Revista da SET: Muito tem se falado em adiantar os prazos no que diz respeito ao Switch-Off da TV analógica em algumas regiões. Como andam os prazos neste sentido? Paulo
Bernardo: Em um país com as dimensões e disparidades sociais do Brasil, é praticamente impossível desligar de uma vez a TV analógica. Por isso estamos planejando adiantar o desligamento em algumas localidades e atrasar em outras, ou seja, distribuir esse processo de desligamento a partir de 2015 e terminar depois de 2016. A ideia seria desligar até 2016 para 70% da população brasileira, ou seja, em cerca de mil cidades, incluindo todas as capitais, as cidades grandes e todo o estado de São Paulo. Nestas localidades, acreditamos que a digitalização já esteja mais avançada. No caso dos locais onde postergaríamos o Switch-Off, restaria uma grande área no interior do Centro-Oeste, no Nordeste e no Norte em que não deligaríamos até 2016. Como há a motivação de liberação da faixa de 700MHz para atender às políticas públicas de banda larga, propusemos que, nas cidades onde essa banda está ocupada, o desligamento seja antecipado. Nas outras regiões, podemos gerar um cronograma mais elástico, chegando até 2018. É importante ressaltar que nada disso está fechado ainda. São possibilidades que ainda estamos discutindo internamente para aí sim levar para a presidenta Dilma Rousseff.

Revista da SET: O Governo deve fazer algum programa ou ação de educação para a população no que diz respeito à TV Digital?
Bernardo: Independentemente de como será o cronograma do Switch-Off, uma coisa que precisa ficar clara é que não vamos desligar a TV analógica sem antes fazer um amplo diálogo com a população, com campanhas de esclarecimento e políticas de incentivo, como aconteceu em outros países que já fizeram seu apagão analógico. A nossa preocupação é não deixar a população sem acesso à televisão, pois sabemos que é um elemento que faz parte do dia-a-dia do brasileiro. Daremos uma atenção especial à população mais pobre e que vive longe dos grandes centros. Queremos garantir que elas não fiquem sem acesso à TV. Para isso, uma das possibilidades que estudamos são as políticas de incentivo, benefícios fiscais e subsídios para possibilitar a substituição dos aparelhos de TV analógicos por digitais ou a compra de conversores. Nos casos em que realmente não houver condições, o governo estuda a possibilidade de doar os conversores. De qualquer forma, nada disso vai ser feito sem um amplo estudo de impacto financeiro. Ainda estamos discutindo e colocando na mesa todas as possibilidades para que o processo de substituição da TV analógica pela digital ocorra da melhor maneira possível.

Revista da SET: Como o governo vê a expansão do ISDB-T (Padrão Brasileiro de TV Digital) para países da África (Caso Botswana)? Pode ser considerada uma vitória tecnológica?
Bernardo: Sem dúvidas é uma vitória tecnológica. As características do nosso padrão de TV digital têm sido vistas como vantajosas pelos outros países. Ao todo, 12 países já adotaram oficialmente o ISDB-T, que já é modelo predominante na América Latina. Chegamos ao Uruguai, Argentina, Paraguai, Chile, Bolívia, Peru, Equador, Venezuela e Costa Rica. El Salvador, Nicarágua, Guatemala e Honduras estudam adotar também. Na África, tivemos essa grande conquista que foi a adesão oficial de Botswana agora em março. Nós acompanhamos de perto a escolha. Eles fizeram uma análise muito minuciosa e ficamos muito satisfeitos por nosso sistema ser considerado superior por uma equipe tão exigente. Isso fortalece o padrão a nível mundial e faz criar escala, o que impacta diretamente nos preços de receptores e transmissores. Entrar na África também é uma vitória tecnológica, porque é o primeiro país com canalização em 8MHZ que adota o ISDB-T, abrindo a possibilidade que outros países com canalização semelhante adotem esse sistema. Estamos num rico diálogo com outros países do continente, como Angola e Moçambique, que têm diversas afinidades com o Brasil.

Na hora de avaliar, de botar na balança, os países levam em conta principalmente a interatividade, a viabilidade econômica e a qualidade de transmissão e recepção do ISDB-T. Mas outro atrativo muito forte e que não posso deixar de mencionar, porque é um diferencial, é a possibilidade de adaptação do padrão nipo-brasileiro à realidade de cada país. Então os países africanos, assim como os demais países que já adotaram, levam em consideração as oportunidades de negócios e a possibilidade de envolver empresas locais na cadeia de valor da TV. Isso é muito importante. Nossa parceria não acaba depois que o país anuncia a adesão. Seguimos sempre num diálogo, buscando troca de experiências e firmando acordos de cooperação, que incluem treinamentos e capacitações nas áreas de indústria, pesquisa e inovação.

Revista da SET: Quais são as atuais ações do Mini- Com para a implementação do Rádio Digital?
Bernardo: No ano passado, testamos o modelo europeu (DRM) e o modelo norte-americano (HD Radio) em parceria com o Inmetro em quatro capitais: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte. Escolhemos quatro cidades grandes com características de população e relevo bem distintas, justamente para verificar o funcionamento em várias condições. O que acontece é que os resultados desses testes não foram considerados satisfatórios pelo Conselho Consultivo do Rádio Digital, que é coordenado pelo Ministério das Comunicações e tem representantes do governo, do Legislativo, da indústria, pesquisadores, enfim, é um grupo plural criado para nos ajudar a escolher o melhor modelo para o Brasil. O que preocupou o Conselho foi justamente a existência de zonas de sombra nesses testes. Porque, no rádio digital, ou pega com uma qualidade excelente ou não pega. Então a cobertura deixou a desejar. Trabalhamos com a ideia de que o rádio digital não pode excluir, ter zonas que antes eram cobertas pelo analógico e que ele não pega. O rádio digital tem que incluir. O conselho está agora avaliando a necessidade de realizar novos testes em 2013, já buscando uma melhor cobertura. É uma possibilidade. E, nesse caso, também testaríamos questões como a multiprogramação e a adaptação do Ginga, que é a ferramenta de interatividade na TV digital, para o rádio.

Revista da SET: Muito tem se dito que a tecnologia de Rádio Digital não está na pasta de prioridades do Governo. Isto é real e porque?
Bernardo: Não é verdade. O que acontece é que não vamos tomar nenhuma decisão de forma precipitada. A digitalização do rádio é um avanço importante para o país, assim como foi o processo com a televisão. Abre-se um vasto horizonte de possibilidades, de modelos de negócio. Podemos pensar em aplicativos e potencialidades para educação, saúde e as mais diversas políticas públicas. Isso beneficia o cidadão. Todos esses aspectos estão no horizonte do Ministério das Comunicações. Mas, antes de optar por um modelo, é preciso verificar se os sistemas têm boa cobertura e qual seria a melhor configuração deles para atender às necessidades específicas do Brasil. Por isso estamos fazendo tudo com cautela. É importante lembrar que essa decisão não é só técnica. Tem toda uma questão de indústria e negociação internacional que precisa ser levada em conta.

Revista da SET: Há algum projeto em andamento para maior desburocratização do licenciamento de estações de radiodifusão?
Bernardo: Desde que assumimos o Ministério das Comunicações, nós conseguimos desburocratizar bastante a análise de processos de radiodifusão. Quando chegamos, nos deparamos com um estoque gigantesco de 49 mil processos, alguns até de 15 anos atrás. Montamos uma força-tarefa para enfrentar esse estoque e dar agilidade à análise dos processos. Para isso, nós modificamos regras, mudamos procedimentos e trabalhamos também para mudar a cultura organizacional dentro do ministério. Tem dado certo. Agora, os processos tramitam aqui de forma mais racional. O resultado está aí: em 2012 reduzimos consideravelmente o estoque, terminando o ano com 28.500 dos 49 mil processos que encontramos. A nossa meta é terminar 2013 com 15 mil, o que não representa estoque, apenas o fluxo normal. Outra medida que vai ajudar a reduzir a burocracia é a informatização dos processos de radiodifusão. Queremos eliminar totalmente o uso do papel a partir de 2015, de modo que todos os novos processos que entrem no MiniCom tramitem numa plataforma virtual. Isso reduziria o tempo de resposta do poder público, além de permitir uma comunicação mais eficiente e prática com o radiodifusor. Já temos um grupo trabalhando no projeto de modernização do sistema e queremos disponibilizar essa ferramenta para testes já em 2014.

Revista da SET: O MiniCom anunciou investimentos em redes de fibra óptica que chegariam aos R$ 7 bilhões até o início de 2015. Isso se implantaria, com a aplicação, de cerca de R$ 1 bilhão por ano na Telebrás, que entraria com um forte incremento na construção de fibra óptica para desta forma preparar o país para ter uma acesso maior a redes de alta velocidade. Em que situação está e porque se tem falado na mídia que a Telebrás não tem conseguido avançar neste plano de desenvolvimento?
Bernardo: A Telebras está cumprindo o cronograma. No final de janeiro, cerca de 74% das obras executadas nas seis cidades-sede da Copa das Confederações – Brasília, Salvador, Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Fortaleza – estavam concluídos. Já para as outras cidades-sede da Copa do Mundo – São Paulo, Cuiabá, Natal, Manaus, Curitiba e Porto Alegre – a expectativa é que todas as redes metropolitanas sejam entregues até dezembro deste ano.

Revista da SET: Explique o porque da assinatura do “Memorando de Entendimentos entre a União e Federação Internacional de Futebol visando a garantia de um serviço ‘exemplar’ de telecomunicações para a Copa 2014 realizada a final de janeiro de 2013”. E quais os principais tópicos deste memorando.
Bernardo: Copa das Confederações 2013 e Copa do Mundo 2014: 1. Responsabilidades do Governo Federal (Ministério das Comunicações, por meio da Telebrás): a. disponibilizar infraestrutura nacional de backbone e de redes metropolitanas necessárias para a interconexão entre os estádios e outros locais definidos pela FIFA e o Centro Nacional de Transmissão (International Broadcaster Center – IBC), bem como o serviço de transporte de vídeo, sem custo para a FIFA ou seus parceiros; b. garantir que a infraestrutura atenda aos requisitos técnicos de qualidade estabelecidos pela FIFA, sobretudo a disponibilidade de 99,99% exigida para as redes que transportarão o serviço de transmissão de vídeo dos jogos; c. implantar a interconexão entre a rede da TELEBRÁS e as redes dos provedores de serviços de TI e de Mídia contratados pela FIFA; d. disponibilizar infraestrutura e soluções de TI (voz e banda larga) tão somente nos locais em que os provedores de serviços de TI e de Mídia contratados pela FIFA não disponham de infraestrutura conforme os requisitos de qualidade exigidos, o que deve ser comprovado por laudos técnicos fornecidos pela FIFA; 2. Responsabilidades da FIFA: a. desonerar o Governo Federal de prover a infraestrutura nos locais onde os prestadores de serviços de TI e de Mídia possuírem infraestrutura disponível conforme os requisitos de qualidade; b. obter e implementar a Tecnologia de Adaptação de Vídeo (VandA) e arcar com todos os seus custos; c. implementar a solução de rede de back-up por satélite e arcar com todos os seus custos; d. remunerar à TELEBRÁS 50% das receitas provenientes das vendas de serviços de vídeo fornecidos pelo sistema VandA. O memorando ainda cria um Grupo de Monitoramento composto por representantes do Ministério, da Telebrás e da FIFA e seus parceiros, responsável pelo acompanhamento conjunto da implementação da infraestrutura e dos serviços de telecomunicações para os eventos da FIFA e pelos eventuais esclarecimentos sobre os cenários de telecomunicações para cada um dos locais do evento.

Revista da SET: Muito se tem falado do legado da Copa 2014 para o país, no que diz respeito as Comunicações, qual será o maior legado?
Bernardo: Nós enxergamos não apenas a Copa, mas também outros grandes eventos que o Brasil vai sediar, como oportunidades. Queremos acelerar a popularização da internet em todo o país. Queremos ter serviços com mais tecnologia, como o 4G. Assim, aproveitando o calendário da Copa das Confederações, da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016, casamos o cronograma com o dos eventos. Então, por exemplo, o celular de quarta geração terá que funcionar nas 12 capitais da Copa até o fim do ano. Nas seis cidades da Copa das Confederações, até maio. Em Recife, por exemplo, o pessoal começou a vender 4G em dezembro do ano passado. Para um evento como esse, há duas coisas absolutamente imprescindíveis: o estádio com gramado em condições perfeitas e serviço e infraestrutura de comunicação para todos poderem acompanhar. Um evento da Copa costuma ter até três bilhões de pessoas conectadas ao redor do mundo. Toda essa infraestrutura ao redor do estádio ficará como legado e servirá para todos usarem depois. Vai melhorar nossa capacidade de internet, de televisão e de fazer serviços multimídia por muito tempo.

Revista da SET: Regime Especial de Tributação do Programa Nacional de Banda Larga (REPNBL), que integra o plano Brasil Maior, é uma proposta do Mini- Com para ampliar a oferta de serviços de banda larga no país e baratear os preços. Quando acha que isso poderá vir a acontecer?
Bernardo: Com a publicação da portaria 55/2013, as empresas já podem cadastrar projetos de ampliação e modernização das redes de telecom. Depois de ter o projeto aprovado, as empresas deverão solicitar habilitação ao REPNBL junto à Receita Federal. Após essa etapa, a implementação do projeto estará desonerada de IPI, PIS/Pasep e COFINS incidentes sobre máquinas, instrumentos, equipamentos novos e materiais de construção. A contratação dos serviços de mão-de-obra necessários para instalar as redes também será desonerada de PIS/Pasep e COFINS.

Revista da SET: Que medidas o Governo pretende tomar para gerenciar os testes com o 4G e a utilização da banda de 700 MHz?
Bernado: A destinação da faixa de 700 MHz para as prestadoras de serviços móveis não poderá, em momento algum, fazer com que cidadãos brasileiros corram o risco de ficar sem o mais universal de nossos serviços, que é a televisão, presente em pelo menos 95% de nossos domicílios. Do mesmo modo, essa transição terá de ser feita de modo a que radiodifusores públicos e privados, de pequeno e de grande porte, tenham as condições econômicas suficientes para a garantia de continuidade de seus negócios face aos custos da digitalização. Por isso, tanto o Ministério das Comunicações quanto a Anatel estão estudando a questão detalhadamente e conversando com a sociedade e os diversos setores envolvidos. A Anatel está, inclusive, realizando uma consulta pública sobre o tema. O documento está à disposição da sociedade no site da Anatel até o dia 14 de abril. Além disso, a Agência também deve realizar uma audiência pública para debater o assunto.

Flávio Bonanome
Redação: Revista da SET