TV aberta no Brasil na era dos conteúdos via internet
SET Sudeste 2017
por Gabriel Cortez e Fernando Moura
Liliana Nakonechnyj moderou o painel “Situação atual e futura da TV aberta no Brasil na era dos conteúdos via internet”. Antes de passar a palavra aos convidados, a presidente da SET destacou que o consumo de vídeo não-linear no mundo continua subindo, enquanto o consumo de TV linear desacelera, especialmente entre os millennials. “Ficam, então, algumas questões para tentarmos responder neste painel: como a TV aberta está posicionada no Brasil? Quando os jovens estiverem mais velhos, retornarão à experiência contemplativa de ver TV? Mais do que isso: vale à pena planejar o futuro multiplataforma? E, por fim, a transição para infra IP, o uso da nuvem e a migração do modelo de investimentos para o modelo de serviços será ou não inevitável?”, problematizou.
José Chaves, diretor de engenharia e tecnologia da Band, acredita que o perfil do consumidor e o comportamento do telespectador, de fato, vêm se alterando. “Antigamente, a audiência era passiva. Hoje, o cara quer postar, quer atuar. Esse modelo que vem nos dando sobrevida há quarenta anos pode sucumbir nos próximos dez ou quinze anos, ou não. O nosso grande desafio é transformar o que sempre fizemos em algo que seja adequado a esse novo público. O conteúdo é o rei nesse contexto. Se o conteúdo for acertado, com uma grande ideia e um excelente trabalho de engenharia e operações, o público responde bem”, frisou.
Os investimentos em infraestrutura também serão diferenciados daqui para frente, de acordo com o palestrante. “O que a gente compra hoje são licenças de players. As fitas e os VTs, por exemplo, estão obsoletos. A Band já é tapeless há nove anos. A evolução dos sistemas de transmissão e dos formatos é outro aspecto ao qual devemos nos atentar. O ATSC 3.0 já parte da internet sem fio, da banda larga e de transmissões que mesclam broadcast e broadband”, pontuou.
Sérgio Santoro, da Record TV, lembrou que a televisão aberta brasileira cobre quase 100% dos domicílios no país, com 67 anos de atuação, enquanto o acesso à banda larga ainda é restrito a poucas cidades. Apenas 37 municípios concentravam 50% do uso de banda em 2016. Além disso, em julho de 2017, os 27,9 milhões de acessos à internet no país foram realizados de apenas 40,98% dos domicílios brasileiros, de acordo com o executivo. “Então, embora se fale muito da tendência ao OTT, ainda há um caminho muito grande a ser percorrido nessa área. As emissoras e as grandes redes vivem um momento para melhorar as suas soluções e atender a esse segmento que ainda engatinha no país”, argumentou.
Paulo Henrique Castro, diretor de tecnologia, pesquisa e desenvolvimento da Globo, mostrou-se incomodado com a semântica do termo “morte” da televisão e, assim como Santoro, também relativizou a expansão do OTT no país. “Se os dados apontam um aumento no OTT, pode ser que os conteúdos exibidos On- Demand sejam produzidos pelo que conhecemos hoje como emissoras de televisão ‘tradicionais’. Além disso, a TV aberta ainda fala com a massa. Quando, por exemplo, o Faustão falou o número da Seja: Digital em um domingo, houve problema pois a central da EAD não estava preparada para receber tantas ligações”, ponderou.
O executivo mencionou, então, a teoria da cauda longa e afirmou que as pessoas ainda conversam muito sobre o que está na TV aberta, apesar de os interesses de nicho também crescerem. “É muito desagradável quando saímos e conversamos sobre uma série, por exemplo, e as pessoas estão em estágios diferentes, ou não querem saber do que você assistiu porque ainda não viram aquele determinado episódio. O conteúdo em real-time, as novelas e o jornalismo ganham força na TV aberta neste contexto, reforçando a sua característica massiva. Eu acho que há espaço para todos, porque qualquer meio de distribuição que se baseia em assinatura, no longo prazo, precisa mostrar valor. O broadcast ainda é muito eficiente e, por isso, eu não fico tão preocupado com essa questão do ‘vai acabar’”, ponderou.
Os algoritmos estão começando a oferecer às emissoras possibilidades de descobrir quais intermediários agregam valor para a massa, segundo Castro. “Repensar processos e estruturas é fundamental. Mas, precisamos lembrar que o país passa por um momento de recessão. A era de ouro não só da televisão, mas de quase tudo, está acabando. Estamos chegando em um momento em que as empresas já começam a analisar os dados da pessoas. A inteligência artificial ajuda em uma revisão dos processos. Além disso, trazer os jovens para essa discussão é fundamental! São eles que vão trabalhar nessa revolução. Não podemos deixá-los entrar nessa vibe de que a TV vai ‘morrer’. A mágica da TV ainda tem um valor muito grande”, concluiu.
Raimundo Lima, diretor de tecnologia e operações do SBT, concordou: “Eu acredito na TV aberta. A nossa capacidade de sobrevivência está ligada ao entendimento do que o telespectador quer, buscando incorporar essas demandas. Temos uma plataforma de um para muitos e, do ponto de vista do modelo de negócios, isso ainda é fundamental. O que precisamos fazer é perceber quais são as novas demandas e adequarmos as nossas plataformas a essa realidade. Por mais que Netflix e Amazon venham com conteúdos inéditos, nós broadcasters ainda temos capacidade de produzir material interessante. É isso que sustentará a televisão aberta”, frisou.
Paulo Canno, SET/TV Gazeta, apresentou a situação das afiliadas neste ambiente multiplataforma e destacou que, nestas emissoras, a realidade é diferente da realidade das cabeças de rede. “Com mais de três décadas vivendo a realidade das afiliadas, a gente sabe que a geração de conteúdo restringe-se ao telejornalismo local. Mas, este conteúdo não é suficiente para manter a atenção do público que fica zapeando por muito tempo, o que faz com que as afiliadas dependam muito do conteúdo das ca-beças de rede para sobreviver e para concorrer nesse mundo digital.”
O custo dos investimentos que têm sido necessários por conta do switch-off analógico e da revolução tecnológica pode ser fatal às afiliadas, na opinião de Canno. “A audiência das afiliadas até tem aumentado nos últimos anos para algumas empresas. O problema tem sido a receita, que tem caído de forma sistemática. A audiência demanda mobilidade, um conteúdo diferenciado e não-linear, além de interatividade (comentar, votar, etc.)”.