RELATO DE TESTES REALIZADOS PELA ANATEL, EM GOIÂNIA

DESTAQUE

RELATO DE TESTES REALIZADOS PELA ANATEL, EM GOIÂNIA, ENVOLVENDO A TECNOLOGIA PLC E A CONSEQÜENTE OCORRÊNCIA DE INTERFERÊNCIA NOS SERVIÇOS DE RADIODIFUSÃO SONORA, QUE OPERAM NAS FAIXAS DE HF E EM ONDAS TROPICAIS E CURTAS

Por Sérgio Neiva

Radiações interferentes na radiodifusão sonora

Tendo em vista o incremento da demanda de serviços e aplicações TCP/IP, as operadoras de telefonia têm se interessado na integração de voz, vídeo e dados numa única infra-estrutura. Espera-se, com essa convergência, minimizar os custos de operação, aumentar a escalabilidade e facilitar a implementação de novos serviços.
Nesse contexto, a tecnologia PLC (Power Line Communication), como tecnologia de telecomunicações, aplica-se ao segmento de acesso e ao segmento de distribuição, permitindo flexibilidade e universalidade na composição da rede de telecomunicações. Trata-se de uma opção eficiente nas instalações de rede elétrica das concessionárias de energia e no emprego de novas instalações. Com isso, a Companhia Energética de Goiás (CELG) pretende aproveitar sua infra-estrutura de malhas e cabos de energia elétrica, para agregar novos serviços de telecomunicações, através da tecnologia PLC.
Geralmente, o PLC também é denominado Broadband over Power Line (BPL), Power Line Telecommunication (PLT) e Power Line Broadband (PLB) [5]. Seu princípio básico de funcionamento é a transformação da grade de potência numa rede de comunicação, pela superposição de um sinal de informação de baixa energia, ao sinal de corrente alternada de alta potência. Para assegurar a coexistência e separação dos dois sistemas, a faixa de freqüência utilizada para comunicação é bem distante da freqüência de 60Hz utilizada pelas senóides de energia. Para aplicações banda estreita, o PLC opera de 3 a 148,5KHz e, em aplicações faixa larga, de 1,7 a 34MHz. Porém, os equipamentos de 2ª geração conseguem operar no modo banda estreita e banda larga na mesma faixa de freqüência, ou seja, de 1,7 a 34MHz.
Os dispositivos PLC usam técnicas de modulação por espalhamento espectral e por multiportadoras ortogonais OFDM. Nos testes presenciados em Goiânia, todos os equipamentos utilizavam OFDM.
As especificações dos equipamentos de 2° geração testados, garantem densidade espectral de potência transmitida menor ou igual a –50dBm/Hz, taxa de transmissão de bits na camada física de 200Mbps e alcance de 2Km até o próximo repetidor. Todos os fabricantes utilizavam PLC’s com chipset DS2, o qual oferece inovações para mitigação de interferência.
Contudo, como um dispositivo operando com Power Spectral Density (PSD) tão reduzido, pode causar intensas radiações não-intencionais na faixa de HF?
Primeiramente, é fato que as linhas de distribuição de energia elétrica não foram feitas para transmitir sinais de radiofreqüência (RF), mas sim, ondas de baixa freqüência e alta energia. Evidentemente, a condução de sinais RF, através de linhas de tensão, acontece de maneira muito precária, com atenuação significativa ao longo do percurso e, inevitavelmente, com irradiação em toda a faixa de espectro de operação do PLC [1], ou seja, de 1,7 a 34MHz.
Aparentemente, visto que os fabricantes de PLC observam emissões de radiações não-intencionais, os equipamentos de 2ª geração testados em Goiânia apresentam técnicas para mitigação de interferência, através do novo chip DS2. São dois mecanismos: filtro Notch e Seleção Dinâmica de Freqüência (DFS). O filtro Notch traz a possibilidade de reconfiguração do PLC, para que o equipamento opere em outras faixas de freqüência evitando, portanto, interferência nos serviços em HF. A técnica DFS, como o próprio nome já diz, é um mecanismo que permite o PLC suprimir, automaticamente, as subportadoras OFDM que, porventura, coincidam com freqüências de outros serviços operantes na faixa.

EQUIPAMENTOS UTILIZADOS
• Analisador de espectro
• Notebook conectado ao analisador
• Antena Loop
• Receptor com seleção na faixa de Onda Média, Tropical e Curta
• Dispositivos PLC: Modem e Gateway
• Câmera Fotográfica Digital

METODOLOGIA DOS TESTES
Inicialmente, a intenção da Anatel era verificar o funcionamento do PLC em ambientes externos (espaço livre – outdoor) e ambientes fechados (indoor).
As medições se caracterizavam na captura da intensidade de campo elétrico, na faixa de 1,785MHz até 35MHz. Cada medição de campo elétrico era registrada com a captura da tela do analisador de espectro, a qual era reproduzida no notebook.
Para efeito de análise e comparação posterior, eram realizadas medições do ruído de fundo antes do funcionamento do PLC e, evidentemente, durante o funcionamento do PLC com transmissão efetiva de dados na rede elétrica.
Cada medida de intensidade de campo elétrico era realizada com três posições de antenas distintas. Adicionalmente, nas medições de interferência no espaço livre, o campo elétrico foi aferido repetidamente a cada 10 metros de distância da linha de tensão acoplada ao sinal PLC.
Como o PLC opera com um sinal faixa-larga, o recurso MaxHold do analisador foi utilizado para detectar a potência de quase-pico, nas componentes de freqüência de 1,785 a 35 MHz, a fim de identificar o espectro real causado por irradiações do sistema PLC.
Para avaliar as interferências ocasionadas, especificamente, no serviço de radiodifusão na faixa supracitada, foram realizados procedimentos de sintonização de emissoras com o PLC desligado e ligado, num receptor SONY, modelo ICF-SW11. O receptor utilizado possui as seguintes características:
• Antena Telescópica
• Sintonia seletiva em 12 bandas, incluindo Ondas Médias, Tropicais e Curtas
• Alta sensibilidade de sintonia
• Sintonizador manual e analógico

CRONOGRAMA DOS TESTES E DESCRIÇÃO DOS RESULTADOS
Primeiro dia
• Testes outdoor, com equipamentos do fabricante Corinex, na rede de baixa tensão de 220Volts. Local: frente da Biblioteca Central da UFG, Campus II Samambaia.
• Presença do exército. Avaliação de interferência nos equipamentos de comunicação do exército, que operam na faixa de HF.
• Impossibilidade de teste com equipamentos Motorola, pelo mau funcionamento do link de rádio de microondas, necessário para execução do experimento.
O teste de interferência nas emissoras de radiodifusão local e internacional (Ondas Curtas) baseou-se no registro de imagens de recepção de sinal, com o PLC ligado e desligado. Ocorreu também a aproximação do receptor às linhas de tensão com sinal PLC, sendo que o receptor se encontrava suficientemente distante para não sofrer interferência (200m) e a recepção do sinal de radiodifusão estava absolutamente inteligível e com boa qualidade. Houve também a verificação “instantânea” de interferência, através de verificação das condições de recepção, no exato momento em que os dispositivos PLC eram ligados. Não houve testes no período noturno.

Segundo dia
• Continuação dos testes outdoor, com equipamentos do fabricante Corinex, na rede de baixa tensão, 220Volts. Local: frente da Biblioteca Central da UFG, Campus II Samambaia.
• Testes com equipamentos do fabricante Mitsubishi Electric, baixa tensão 220Volts.
• Continuação dos testes com equipamentos do exército.
O teste de interferência nas emissoras de radiodifusão local e internacional se baseou nos mesmos procedimentos realizados no primeiro dia, entretanto, com mais riqueza de detalhes devido à experiência decorrida do dia anterior. Da mesma forma, não houve testes de interferência no período noturno.
Nesse dia ocorreram duas fases de teste, uma com equipamentos Mitsubishi Electric e outra com equipamentos Corinex. Os testes com os dois fabricantes seguiram a mesma metodologia.

Terceiro dia
• Último teste envolvendo o exército, para eliminar a dubiosidade surgida no dia anterior, envolvendo PLC e os equipamentos do exército, pois as condições de comunicação não se alteravam com o PLC ligado ou desligado. Parte da manhã. Local: frente da Biblioteca Central da UFG, Campus II Samambaia.
• Testes indoor, com equipamentos Home-Plug do representante Advanced. Parte da tarde. Local: Laboratório de Informática da Biblioteca Central da UFG.
O teste de interferência nas emissoras de radiodifusão local e internacional se baseou somente na verificação da qualidade de recepção, na presença do sinal PLC trafegando na rede elétrica. Houve registro da sintonia de uma emissora internacional em Ondas Curtas (BBC – 15190KHz) durante o funcionamento do PLC e no exato momento em que foi desligado e ligado.

Quarto dia
• Teste outdoor na rede elétrica subterrânea, com equipamentos Corinex em baixa tensão 220Volts. Local: Alphaville. Parte da manhã.
• Teste outdoor na rede elétrica compacta, com equipamentos Corinex. Baixa tensão 220Volts. Local: lateral da Biblioteca Central da UFG, Campus II Samambaia. Parte da Tarde.
No quarto dia ocorreram as medidas de intensidade de campo elétrico, como nos dias anteriores. O objetivo principal dos testes era verificar o comportamento da emissão de radiação não-intencional, em ambientes diferenciados, como na rede elétrica subterrânea e na rede elétrica compacta.
Os testes de interferência no serviço de radiodifusão se basearam nos mesmos procedimentos realizados nos dias anteriores. Houve registros das condições de recepção com o PLC ativo e trafegando informação sobre a rede elétrica, como também com o dispositivo desligado.
Entretanto, a subjetividade empregada para descrever as condições de recepção presenciadas durante os testes, pode ser fomentada através da análise do espectro durante o funcionamento do PLC. Com o tráfego de informação na rede elétrica, o espectro na faixa de operação do PLC apresenta anomalias e, de certa forma, comprova as condições adversas em que as emissoras de ondas Tropicais e Curtas foram sintonizadas no receptor.

CONCLUSÕES
Os resultados experimentais obtidos, fornecem indícios suficientes para identificar uma interferência destrutiva nas portadoras de rádio, do serviço de radiodifusão sonora em Amplitude Modulada, nas proximidades das linhas de tensão, que trafegam os sinais PLC. A degradação em ambientes indoor foi muito mais intensa quando comparada ao espaço livre.
O receptor utilizado nos testes não conseguiu sintonizar nitidamente nenhuma emissora na faixa de freqüência de operação do PLC, colocando em xeque a inteligibilidade do som, sendo que, em algumas circunstâncias, não foi possível escutar nenhuma emissora na faixa. A distância limite verificada para a ocorrência de interferência era de 15 metros, distante da linha de tensão. Além do mais, a intensidade dos níveis de radiação não-intencionais, decorrente do funcionamento do PLC, ultrapassam os níveis de segurança estabelecidos pela ITU [1]. Tendo em vista que a interferência em ambientes fechados foi maior do que no espaço livre, é aconselhável a realização de testes adicionais em centros urbanos altamente povoados, cujas instalações elétricas reflitam situações existentes na maioria dos municípios brasileiros.
Outro ponto negativo, observado durante os dias de teste, foi a instabilidade dos equipamentos PLC, que não atingiram as taxas de transmissão desejadas e não funcionaram na rede de média tensão, 13,8kVolts.
Finalmente, as técnicas de mitigação de interferência, decorrentes do novo chipset DS2, não tiveram eficácia claramente comprovada durante os testes.

7 Referência  – [1] Document 6/229(Rev.1)-E – DRAFT NEW RECOMMENDATION ITU R BS.[Doc. 6/229]- Protection requirements for broadcasting systems operating in the LF, MF, HF and VHF bands below 80 MHz against the impact of power line telecommunication (PLT) Systems
[2] Document 6E/319-E – DRAFT NEW RECOMMENDATION ITU R BS.[Doc. 6/229] [3] http://www.qrpis.org/~k3ng/bpl.html#1
[4] http://www.arrl.org/tis/info/HTML/plc/
[5] http://www.plcforum.com/frame_plc.html
[6] http://www.corinex.com/
[7] http://www.anatel.gov.br
[8] http://www.aneel.gov.br

O Autor – Sérgio Neiva é estudante de Engenharia de Redes de Comunicação da Universidade de Brasília e desenvolve sistemas para a indústria de Telecomunicações na Accenture do Brasil
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Título original: Radiações Interferentes no Serviço de Radiodifusão Sonora na Faixa de 1,7 a 30MHz Causada por Equipamentos PLC