“Porquê não conseguimos visualizar ao telefone? Ou Por quê Transmídiar?”

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As transformações na modo de criar conteúdo em um cenário de tecnologias convergentes em multi-midia.

Nº 130 – Jan/Fev 2013

Por Por José Renato Bergo Foto: Divulgação/SXC

ARTIGO

Aprimeira parte da frase acima é um parágrafo do livro cânone “Os Meios de Comunicação como Extensões do Homem” de Marshall MacLuham [1996 –Editora Cultrix], no capitulo dedicado ao telefone, e em que o autor explica como esta mídia aproxima ou até teletransporta as pessoas para próximo, tanto queira, de seu interlocutor. No livro bibliático (sic) de Henry Jenkis, Cultura da Convergência [2008 – segunda edição ampliada – Editora Aleph], ele se surpreende quando sai para comprar um telefone; celular diga-se; mas não encontra nenhum que apenas “fale”. Todos os modelos mandam torpedos, fazem fotos e gravam vídeos, possuem jogos, tocam música, navegam na web e até te fazem companhia se desejar.
Passado algumas décadas, já deu para perceber que além de visualizar, o “ouvinte-falador” já interage e foi além. Transportou um conteúdo de seu núcleo pessoal ou profissional de interação (amigos, família, clientes) para um núcleo exponencial de interações fora de sua orbita pessoal cotidiana. Se pudesse, interagiria até com mortos, como proposto no projeto vencedor do LabTransmedia do último Rio- ContentMarket 2012, “Contatos” da Segunda-feira filmes do Rio, que foi antes de tudo uma grande apresentação de projeto no estilo “picthing”.
Para justificar a frase no título tenho que dizer o obvio: “o desenvolvimento de dispositivos convergentes é cada vez maior”, e apesar da tentativa de nos mantermos no controle do que conhecemos, somos quase impelidos a ir para o futuro e tentarmos entender o que é ou será a transmídia, seja contar histórias em diferentes mídias, ou narrativas multiplataformas ou seja lá o que for, o fato é que está aí, e que a audiência já está nela. A segunda parte da frase acima, lá no topo do texto, é uma destas perguntas chaves que não querem calar quando o “novo” aparece, quando uma evolução (no sentido de evento após outro) encaminha-se na nossa linha do tempo.
Do ponto de vista de um produtor cultural/audiovisual, pensar sobre isto basicamente passa por: “Como se construir um conteúdo agora?” ou “Devo ou não entrar neste fluxo?”. Fora os motivos de cada um, fica claro que fazer parte deste fluxo vai aumentar a complexidade de produção (alguém discorda?), mas deixar de lado uma perspectiva transmidiática para o conteúdo de seu projeto, é com certeza uma opção de risco em um mercado cada fez mais competitivo de comunicação.
Então porque transmídiar? E como transmídiar o conteúdo que a priori nos parece cabível dentro do modelo que pensavamos inicialmente e que (aparentemente) estava bom? Música na rádio, em shows ou.. e agora no Mp3! Vídeo no DVD e agora no youtube! TV de assinatura ou web e agora no mobile! Se a mídia já está convergente? E os conteúdos, estão? Recentemente visitei e conversei com Marcelo Bauer, da CrossContent, Jornalista especialista em novas mídias e conteúdista convicto, focado no que ele denomina como webdocumentários, algo como um infoaudiviosual não ficcional em plataforma web. Há um exemplo muito bom no portfólio dele, Rio de Janeiro/ Autoretrato que versa sobre favelas no Rio como pano de fundo, e como primeiro plano, profissionais fotógrafos que ali moram.
O que rola de interativo é você ver os vídeos ou fotos, e postar comentários, para e pelas redes sociais que se aderem à narrativa do capitulo. Sua intenção é levar as imagens captadas pelos fotógrafos para uma exposição física, mas também interativa. Não é exatamente o que entendo como um modelo transmídia, mas mais uma convergência cross conteúdo, o que cá entre nós acaba raspando na experiência midiática da Caixa Preta (Todas as mídias em um único box device) de que fala Henry Jenkis. Este diz, ainda, que o ideal para um projeto se definir como transmídia é seguir o que chamou de os 7 princípios capitais. Compartilhamento / Profundidade. Grau de interesse que o usuário tem de se aprofundar naquele conteúdo apresentado naquela mídia, e, a motivação que ele tem em compartilhar (chamar) outros a participar do que vê naquela mídia.
Continuidade / Multiplicidade. A aplicação de uma narrativa continua, complementar e plausível a partir da historia principal nas mídias franqueadas, ou mesmo uma inversão total da história principal, criando universos paralelos, antagônicos ou até surreais em realce à narrativa principal.
Imersão x Extração. Criação de ambientes (virtuais ou presenciais) para fazer imergir o usuário / fã e desenvolver produtos que podem ser levados ou acessados pelo usuário / fã no seu quotidiano.
Construção de Universos. Elementos e Universos complementares ou não relacionadas diretamente a mídia e à narrativa principal, e que orientam de forma rica o usuário / fã a entender aspectos da historia principal.
Serialidade. Evolução do hiperlink narrativo construído dentro de uma única mídia. Aqui este hiperlink se ampliou para estar simultaneamente ou seqüencialmente em diversas mídias ou plataformas.
Subjetividade. Em mídias franqueadas, a narrativa principal é contada a partir de pontos de vista de terceiros envolvidos ou alheios a narrativa principal, como por exemplo, personagens secundários ou pessoas de fora.
Performance. Característica das extensões transmídia para convidar e trazer, via convite formal ou modo espontâneo, usuários / fãs a partilharem e produzirem conteúdos aderentes à narrativa principal. Contudo ele mesmo, em recente palestra no Transmedia Hollywood2, Visual Culture & Design, e passível de ver no site de vídeos Vimeo, propõe que se atingirmos 4 destas diretrizes estaremos no modelo transmídia.
Outro autor, professor de uma universidade de Barcelona, Dr. Lorenzo Vilches, e especialista no tema (estamos falando de mídias digitais, hein!?) traduz no livro Migração Digital [2001 –Editora PUC Rio], o que viria ser fenômeno emergente e que agora se coloca consolidado: “Esta migração (digital) afeta o imaginário tecnológico, a linguagem e o mercado cultural, as novas formas de narrativas, os comportamentos dos usuários , e também uma nova maneira de viver o espaço e o tempo (…)” Bom, hoje a informação de determinado evento chega tão próximo ou rápido, que não pode ser levado à todos e com o conteúdo intacto por uma só mídia, com risco de saturar a atenção do intermidiático-usuário/fã! Ela prescinde, por estruturação, de variadas mídias para atingir diferentes nichos ou públicos que vão preencher sua expectativa num fenômeno além do zapping, com conteúdos complementares ou mesmo distintos entre si.
Na historia, e é verdade que as marcas (sempre a publicidade) com seus conteúdos publicitários já estavam trafegando em todas as mídias (brands experiencies) faz algum tempos, procurando uma convergência de interação que supunha ser espontânea e afetiva do usuário-cliente. Isto deu, quase sempre resultado com produtos ou engajamento via entretenimento ou travestidos disto, porque a recompensa é o próprio entretenimento. Pode-se ver o que a Coca-Cola vem tentando, e algumas vezes conseguindo com vídeos denominados de flashmobs de promoções. Exemplos como “The Coca Cola Friendship Machine” e “The Coca Cola Happiness Machine” estão no youtube para serem compartilhados.
Talvez esta seja a chave. Colocar foco no entretenimento que o usuário/fã terá, e convidá-lo sempre que possível a ser o realizador/ produtor e até o protagonista. O atual vídeo-ícone do crowndsourcing , Star Wars Uncut: Director’s Cut, 2009 é uma experiência espontânea de fãs internautas e premiada pelo interactive media Emmy em 2010 que só foi finalizada em 2012. De acordo com o organizador, Casey Pugh, a Lucas Film apoiou o projeto. Acho que não dava para ser diferente. Se não é um claro exemplo de transmídia, é claro o exemplo de mobilização que as novas mídias (web) tem sobre as mais velhinhas (cinema). Do público, o que se entende, é que deve se conectar e participar na construção de uma cultura digital não homogênea, porque vai de geeks e interados à empreendedores digitais ou sócio transformadores, a maioria e a meu ver a mais emergente de jovens, ex- -geração Napster e estão interessados em dispositivos modernos e conteúdos interativos, seja colaborativo ou proprietário .
Mas é obvio que formalmente cada nicho trará seu publico especifico se colocarmos conteúdos e subjetividades aderentes para falar com cada publico, e então esta massa, se transformou ao mesmo tempo, em pesquisa de comportamento (antropologia) e em publico alvo para novos modelos de negócios (inovação).
Relevante como foco, a transmídia chegou para ficar e para transformar produtos de entretenimento em produtos de inter-entretenimento, apesar de entender que haverá espaço para as mídias tradicionais e seus modelos de apresentação (por não sei quanto tempo) acredito que mídia é de fato uma coisa carregada de informação; e ainda pensando em MacLuham; destas que transformam o meio e que também transformam o fim.

Sobre o Autor

José é membro do grupo de estudos e projetos #Era- Transmídia dos inovadores ESPM. Atua com planejamento, criação, desenvolvimento e coordenação de projetos de comunicação empresarial e campanhas endomarketing envolvendo diversas mídias, tais como mídias digitais, vídeos e mídia impressa.
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