Entrevista – Herbert Fiuza

ENTREVISTA



Por Gilmara Gelinski

Convidado para assumir a Diretoria Internacional criada recentemente pela direção da SET, o engenheiro Herbert Fiuza, sócio fundador da entidade, acredita que a escolha se deu em função do trabalho que desenvolveu aqui e fora do Brasil, desde 1960, quando se formou em Engenharia Eletrônica pelo Instituto Militar de Engenharia (IME). Além de aluno, ele foi professor e pesquisador da mesma entidade. Seu ingresso no setor de radiodifusão aconteceu em 1965, nas Organizações Globo, com participação no projeto e criação da TV Globo do Rio de Janeiro, exercendo vários cargos por cerca de 20 anos. Chegou a ser diretor de engenharia da emissora e comandou a implantação da interligação das emissoras afiliadas por satélite, em 1982. Três anos depois, aceitou o desafio de trabalhar na reorganização da TV Telemontecarlo, na Itália, adquirida pela Rede Globo. Por lá ficou oito anos e voltou ao Brasil com um vasto conhecimento profissional e uma grande experiência de vida. Com o advento da TV por Assinatura, Herbert descobriu novas possibilidades profissionais trabalhando na Globosat, na Net Brasil e na Globocabo. Participou também da implantação da operadora NETSAT, hoje SKY Brasil, e foi membro do Conselho de Diretores do Intelsat. Mesmo depois de tantos anos trabalhando no setor, em vez de pensar em aposentadoria, o engenheiro Herbert Fiuza, visando à implantação de sistemas de televisão por assinatura via satélite (DTH), desenvolveu trabalhos de consultoria para a Sky, OiTV, CTBC e GVT. E agora, aos 75 anos assume o comando da Diretoria Internacional da SET e do Comitê Internacional formado por profissionais gabaritados instalados em países estratégicos a fim de difundir a SET e os trabalhos realizados pela entidade.

Por que o senhor foi trabalhar fora do Brasil?
Quando a Globo adquiriu a Telemontecarlo em 1985, houve necessidade de deslocar alguns profissionais do Brasil para comandar a reorganização da empresa. Eu fui um dos convidados, embora tivesse uma posição consolidada na Rede Globo, como diretor de engenharia, e já tivesse quase 50 anos de idade, considerei uma boa oportunidade viver algum tempo no exterior e realizar um trabalho profissional bastante desafiador.

Quais foram os trabalhos realizados fora do Brasil?
A Telemontecarlo era uma emissora estrangeira sediada no Principado de Mônaco. Sua cobertura em território italiano se limitava ao norte da Itália e era bastante precária. Basicamente, nosso objetivo era levar o sinal para toda a península italiana, melhorar a cobertura de cada uma das estações e instalar uma estação geradora em Mônaco para ser a origem do sinal e a geradora dos intervalos comerciais e dos filmes. Também foi necessário criar um centro de transmissão e produção em Roma para os programas jornalísticos e de entretenimento, em língua italiana. Esse centro em Roma era interligado ao Principado de Mônaco por uma rede de microondas e da mesma forma – através de uma rede de microondas – era feita a interligação entre a geradora negómonegasca e as estações que cobriam o território italiano.

Foram muitos os desafios?
Esperava permanecer na Itália por no máximo um ano, mas o trabalho foi se tornando fascinante e mais complexo do que se supunha, no início, e a minha permanência por lá acabou sendo mais extensa. Fiquei na Itália por quase oito anos. É interessante considerar que a Itália tem uma superfície menor do que o estado do Maranhão e tinha na época pouco mais de 50 milhões de habitantes. Esse aspecto mais as grandes diferenças climáticas e suas variações durante o ano foram fatores importantes para o desenvolvimento do projeto. Além de responsável pelas instalações em território italiano, era de minha competência a operação da geradora, o que me obrigava a frequentes viagens ao Principado de Mônaco. Além desses trabalhos tive a oportunidade de representar a Telemontecarlo nos Congressos da União Européia de Radiodifusão (UER/ EBU), organização da qual ela fazia parte.

Por que voltou para o Brasil?
Houve dois aspectos principais que influenciaram minha decisão de retornar ao Brasil: A pressão familiar – pois meus pais, já bastante idosos, e meus filhos, além de minha esposa, consideravam que já estávamos muito tempo longe do convívio da família – e o convite que me foi feito pelo Antonio Athayde, que havia sido nomeado Diretor Geral da Globosat, para ajudá-lo na reestruturação da empresa. Como foi ele quem me indicou para ir para a Itália em 1985, achei que também seria uma ótima experiência iniciar esse novo trabalho em TV por Assinatura no Brasil. Além disso, considerei que o meu trabalho na Telemontecarlo tinha sido bastante proveitoso e já estava consolidado. Não parecia existir novas contribuições que eu pudesse apresentar. Com a concordância dos acionistas brasileiros retornei ao Brasil em dezembro de 1992.

Como foi essa troca de experiência internacional?
Trabalhar no exterior é muito mais do que uma conquista profissional. É conhecer outras culturas e vivenciar hábitos diferentes. Quando consegui o domínio da língua italiana, as possibilidades se tornaram imensas, não só no campo das artes, e aí incluo a música e as tradições italianas, como principalmente, na própria história da civilização, que tem Roma como um de seus berços. De volta ao Brasil, toda a experiência adquirida na vida italiana contribuiu para me tornar uma pessoa diferente, mais consciente do valor do conhecimento e do saber.

Depois de atuar no setor internacional, o senhor acredita que pode ser diferente a sua atuação no Brasil?
Retornei ao Brasil há mais de 15 anos. Já faz muito tempo. Na minha idade o que tinha de ser aplicado na vida profissional já foi feito e muito bem. Hoje, não creio que possa fazer mais diferença.

Então, atualmente, o senhor está aposentado?
Tecnicamente falando estou aposentado, pois não trabalho regularmente para qualquer empresa. Entretanto, tenho uma empresa de consultoria. Surgiram recentemente algumas oportunidades temporárias para ajudar a implementação de serviços de TV por Assinatura via Satélite e atuei como consultor nessas ocasiões.

O senhor trabalhou muito tempo na área de TV por assinaturas, como o senhor avalia o desenvolvimento nacional neste setor?
A TV por assinatura começou de uma forma um tanto claudicante devido, principalmente, à falta de regulamentação apropriada e ao descontrole das operações pioneiras. Nos últimos anos, entretanto, ela tem crescido de forma extraordinária, já superando a marca de 10 milhões de usuários. As recentes operações de Direct to Home (DTH) lançadas por operadoras de telefonia fixa e longa distância vieram esquentar o mercado. Essa modalidade, em que o sinal é transmitido por satélite, é a maior responsável pelo grande crescimento do setor. Acredito que, embora o alto nível técnico alcançado pelas transmissões das TVs abertas, ainda há muito espaço para o desenvolvimento de conteúdos para TV paga, principalmente se considerarmos o conceito de mobilidade para esse tipo de conteúdo, que ainda está incipiente em nosso país. E isso será muito bom para todos os competidores.

Por que o senhor considera incipiente o conceito de mobilidade para conteúdos de TV paga aqui no Brasil?
Quando chamo de incipiente não estou me referindo absolutamente à criatividade dos produtores de conteúdo. A disponibilidade de conteúdo para artefatos móveis não parece ser um problema. Mas, e o modelo de negócio? Ainda não se sabe como ganhar dinheiro com isso, pelo menos para pagar os custos, se esse não for o objetivo principal da empresa. Quem vai pagar com satisfação para ver um jogo, um filme ou uma novela numa tela de dimensões reduzidas? Ou isso poderá ser oferecido gratuitamente, como bônus? No Japão as pessoas usam o celular para vídeo games, no trem, indo para o trabalho. Será que isso também vai se repetir na sociedade brasileira? Ou haverá outra escolha inédita, que estimulará a utilização maciça dos artefatos móveis?

Como o Brasil pode melhorar este cenário?
Enquanto não houver respostas concretas para as questões que mencionei, o cenário não vai se modificar. Entretanto, para não ficar em cima do muro em relação à pergunta eu diria que é preciso formular um modelo, perfeito ou não, e colocá-lo em prática. Se não estiver bom, que sejam feitas correções. Mas é preciso começar de alguma forma. Já se sabe que várias ideias estão em gestação. Será importante conhecê- las e avaliá-las.

Desde quando o senhor participa das atividades da SET?
Sou um dos fundadores da SET, mas devido ao tempo em que estive fora do país e o posterior envolvimento com a TV por Assinatura, fiquei afastado do dia a dia da Sociedade. Essa talvez seja a maior dificuldade que estou encontrando para poder colaborar melhor com os meus companheiros de diretoria. Com a ajuda e compreensão deles espero poder produzir o suficiente para justificar a confiança em mim depositada.

Por que o senhor acha que foi escolhido para dirigir a diretoria internacional da SET?
Acredito que pesou bastante a minha experiência internacional, não só na Telemontecarlo, como também no “Board” do Intelsat e na implantação da SKY Brasil, ocasiões em que tive contato com pessoas influentes no setor, que ocupavam cargos importantes em empresas estrangeiras. Também deve ter influído a decisão pessoal de nossa presidente Liliana Nakonechnyj, a quem conheço e privo de sua especial amizade desde que ela era universitária e eu diretor da Rede Globo. Como posteriormente trabalhamos juntos, ela conhece perfeitamente a minha capacidade e deve ter julgado que eu teria competência para iniciar o primeiro ciclo de vida da recém criada Diretoria Internacional.

Como diretor Internacional, quais as ações que o senhor acha importante focar neste momento para que a SET expanda suas ações em âmbito internacional? Estou focado em três ações principais: Fazer a SET ser ainda mais conhecida internacionalmente, atrair sócios estrangeiros, sejam eles empresas ou pessoas físicas, e procurar estabelecer acordos de cooperação com entidades congêneres estrangeiras.

Recentemente foi montado o Comitê Internacional. Qual o papel (objetivo) deste comitê?
Eu e o vice-diretor Enio Jacomino temos nossas ações balizadas pelas diretrizes elaboradas pela direção da SET. Atuamos como membros de uma diretoria. O Comitê tem um papel mais livre, dando suporte à nossa diretoria no exterior, sob a forma de aconselhamento e, principalmente, propondo ações que visem alcançar os objetivos acima referidos, sem amarras a regras ou calendário.

Quem são as pessoas que compõem este comitê e em quais países elas estão?
Eu diria que o nosso é um Comitê pluralista. Temos profissionais atuando em diversas áreas. Entre eles estão: David Wood que trabalha na EBU e está baseado na Suíça; Doutor Osamu Yamada que é professor de Universidade no Japão e Consultor de várias empresas; Juan Carlos Guidobono é argentino e trabalha em Buenos Aires em uma das mais prestigiosas empresas do setor; o mesmo se deve dizer do Luís Padilha, brasileiro, que representa uma das maiores empresas multinacionais do setor de equipamentos de TV, com escritório nos Estados Unidos; E, finalmente, Juan Pablo Alviz, da Albavision, Rede de emissoras de Rádio e TV em língua espanhola, que atua em toda a América Latina, e tem seu escritório central em Miami.

Quais foram os princípios que guiaram a escolha destes representantes?
A escolha foi muito difícil. Surgiram muitos nomes de prestígio, mas prevaleceu fundamentalmente a localização de sua base de trabalho, para que pudesse ser atendida a estratégia de internacionalização da SET e, principalmente, a comprovada experiência de cada um nas atividades do setor. Apesar da dificuldade, acho que conseguimos montar um excelente Comitê.

Como irá funcionar este comitê?
Cada membro do Comitê é livre para propor ações, que serão amplamente discutidas e avaliadas. Não sendo viável fazer encontros pessoais usaremos a comunicação via e-mail e até telefônica, em casos extremos. Se houver a possibilidade de participação de alguns membros nos eventos internacionais anuais, poderemos reunir os presentes e fazer algum debate.

Quais serão as ações que os representantes deste comitê farão nos países que moram e como se espera que estas ações reflitam no setor brasileiro?
O que se espera é que esse aglomerado de pessoas diferentes baseadas em regiões diferentes possa sugerir medidas pontuais para beneficiar a SET, tais como o estabelecimento de algum tipo de cooperação entre instituições. Evidentemente as ações da Diretoria Internacional visam muito mais fortalecer a presença externa da SET. Mas deverão também se refletir indiretamente no setor brasileiro se conseguirmos estimular a presença de estrangeiros em nosso Congresso e Exposição e estabelecer acordos.

Quais são as perspectivas desta nova Diretoria Internacional, principalmente, agora que foi montado o Comitê?
As perspectivas são otimistas, mas sem euforia. Se conseguirmos produzir algo dentro dos nossos objetivos já teremos ajudado bastante a SET.

Como o Comitê foi montado há pouco tempo, foi possível preparar algo para o Congresso da SET, que acontecerá em agosto?
Não houve tempo para que se pudesse organizar algum tipo de convite para o Congresso, através da Diretoria Internacional. Mas, para os próximos anos, a ideia é cooperação, que será a tônica da minha atuação como diretor. Com relação à feira Broadcast & Cable, este ano teremos alguns pavilhões estrangeiros e um deles, o do Reino Unido, com participação importante de empresas, embora não se possa diminuir a importância dos outros grupos estrangeiros. A Diretoria Internacional estará ativa para apoiar no que for possível em relação aos nossos visitantes.

Gilmara é editora da Revista da SET. E-mail: [email protected]