Desafios da Banda Larga Brasileira para o streaming de vídeo

COBERTURA CONGRESSO SET 2012

Por Uirá Moreno Rosário e Barros

No Congresso SET 2012 foram apresentados importantes painéis que abordaram a convergência entre o universo broadcast e o de banda larga. Nestas palestras ficou claro que existem muitas oportunidades para desenvolvimento no campo de produção e distribuição de vídeos pela internet, utilizando diversos dispositivos conectados. Nos painéis foram apresentados produtos que já atendem essa demanda, o que demonstra a viabilidade tecnológica em assistir vídeos on demand (como uma locadora virtual) em um tablet ou celular. Porém para que esse novo hábito se torne uma realidade é necessário que haja uma infraestrutura que suporte a alta banda que o vídeo demanda. O Brasil tem como característica a utilização de serviços de internet residencial em redes que compartilham banda com diversos usuários, sendo que links exclusivos são mais frequentemente encontrados no ramo empresarial. Conforme explica Torres (2001) a velocidade de transmissão em uma rede é altamente dependente do número de transmissões simultâneas. Esse fato explica, em parte, o porquê das variações na velocidade de internet residenciais. A União Internacional de Telecomunicações (ITU) (2011) traz dados que levantam um outro ponto em relação as redes de internet no Brasil. O órgão internacional mostra uma grande disparidade na capacidade das redes de internet nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, conforme observa-se na figura 1.

Apesar das carências apresentadas anteriormente, o brasileiro está em primeiro lugar no tempo mensal de navegação na internet por pessoa, conforme dados do IBOPE Nielsen Online (2009), apresentado na tabela 1. Vale ressaltar que tais dados são relativos ao uso da internet, no trabalho e em domicílios, e que além da navegação em páginas web foi incluído o tempo gasto em aplicativos online, como chats, programas de download, chamadas de voz utilizando IP, entre outros. Além do tempo de navegação o Brasil também tem alcançado números expressivos na quantidade de usuários ativos na internet. Dados do IBOPE Nielsen Online (2011) mostram que em 2010 o Brasil passou a França em número de usuários ativos na internet, e em 2011 chegou ao volume de acessos da Alemanha. As informações apresentadas demonstram um elevado crescimento no setor, que só foi possível graças aos investimentos do governo e de empresas privadas. Porém é importante ressaltar outro aspecto que impacta na utilização de serviços online, principalmente, na visualização de vídeos na web: a velocidade de conexão. Dados da figura 2, revelados pela Nielsen (2011), mostram que o Brasil tem uma distribuição da velocidade média da banda larga bem diferente se comparada aos países citados anteriormente. O que revela uma carência no aumento da velocidade de conexão em nosso país. O percentual de acessos com velocidades maiores que 2 Mbps na Suíça chega a 88% e 64% na Espanha e Itália, enquanto no Brasil somente 21% da população se conecta a velocidades maiores do que essa.

Para se ter uma ideia do que significam tais velocidades para uma recepção de um fluxo de dados de vídeo que serão visualizados instantaneamente por um espectador (conceito de streaming) basta observar as recomendações dos principais fabricantes de set-top boxes para visualização de vídeos online existentes no mercado. No Guia de Codificação de um importante set-top box de streaming vendido nos Estados Unidos está explicitado que para que se tenha uma boa qualidade para um vídeo com resolução SD a codificação deve ter no mínimo uma taxa de 2 Mbps, utilizando H.264 e o protocolo HLS (HTTP Live Streaming). Caso o conteúdo tenha imagens mais estáticas, como cenas de conversas em novelas, é possível ter uma boa qualidade, também em SD, com uma codificação que resulta em 1,5 Mbps. Agora para uma configuração em HD a taxa de bits mínima recomendada é de 2 Mbps, ficando muito melhor a partir de 2,4 Mbps. Porém o mínimo recomendado para uma programação de esportes em HD é a taxa de 3 Mbps (ROKU, 2012). Para um outro fabricante a taxa mínima recomendada para visualização de um streaming de vídeo em HD em seu set-top box, utilizando uma rede wi-fi, tem como taxa total 2,54 Mbps (APPLE INC., 2011). Outra tecnologia, de outro fabricante, também muito utilizada para streaming de vídeo traz a recomendação de no mínimo uma taxa de bits de 1,8 Mbps para um vídeo em HD (LEVKOV, 2010).

Assim, propõe-se, como exemplo, a união dos dados da audiência de internet por velocidade de conexão juntamente com a análise das recomendações de três fabricantes de set-top boxes de streaming de vídeo. Com essa junção de dados pode-se perceber que, no cenário brasileiro, 79% de sua população internauta têm uma condição desfavorável para assistir um vídeo em HD. Isso porque estes têm velocidades menores que 2 Mbps, média mínima necessária para se ver um conteúdo em HD, tomando as recomendações citadas.

Desta forma, para que se consiga assistir conteúdos em alta definição, no Brasil, serão necessários investimentos para aumentar a taxa de download disponível para o usuário residencial final. Esta demanda está tão evidente que o governo federal brasileiro criou, em 2010, o Plano Nacional da Banda Larga, conhecido como PNBL. Este projeto pretende investir na infraestrutura da rede de internet, que o documento aponta como principal fator limitante à ampliação do acesso à navegação em banda larga no Brasil (BRASIL, 2010). Inclusive já existe um decreto de nº 6.424/2008, que traz uma relação entre número de habitantes por cidade e suas respectivas velocidades mínimas de internet, conforme tabela 2, servindo como base para planos de ação.

Portanto, para que se torne uma realidade assistir vídeos utilizando a internet como meio de transporte desse conteúdo é preciso lidar com o desafio de melhorar as condições de entrega de serviço de internet em âmbito nacional. Os investimentos públicos e privados, seguindo o PNBL, podem melhorar bastante o cenário brasileiro. Porém seria de grande importância que estes não sejam unicamente ligados ao plano, mas sim uma meta a ser atingida isoladamente pelas empresas provedoras de acesso. Desta forma, haveria mais um fator para a maior democratização da internet, trazendo informação, serviços e entretenimento a população ao se utilizar, entre outras mídias, do streaming de vídeo como plataforma.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
APPLE INC. HTTP Live Streaming Overview. Cupertino, 2011.
BRASIL. Programa Nacional de Banda Larga. Brasília, Novembro 2010.
IBOPE Nielsen Online. Tempo de navegação do brasileiro alcança mais uma marca inédita. Julho 2009. Disponível em: <http:// www.ibope.com.br/calandraWeb/servlet/CalandraRedirect?temp=6&proj=PortalIBO PE&pub=T&nome=home materia&db=caldb&docid=0C603C3C20140371832575F3 004B038C>.
IBOPE Nielsen Online. internet no Brasil cresceu 14% em um ano. Novembro 2011. ITU. The World in 2011: ICT Facts and Figures. [S.l.], Outubro 2011.
LEVKOV, M. Video encoding and transcoding recommendations for HTTP Dynamic Streaming on the Adobe Flash Platform: Preliminary Recommendations. San Jose, CA, Estados Unidos, Outubro 2010. NIELSEN. Swiss Lead in Speed: Comparing Global internet Connections. Abril 2011. ROKU. Encoding Guide. Agosto 2012. Disponível em: <http://confluence.roku. com/x/z4Av>.
TORRES, G. Rede de Computadores: Curso Completo. Rio de Janeiro: Axcel Books do Brasil, 2001

Uirá é Mestrando Pesquisador no Laboratório de Televisão Digital da Universidade Presbiteriana Mackenzie . E-mail: uiramoreno@gmail .com