Antônio João Filho – Entrevista

*Raphael Bontempo
 
   
 

O Projeto de Lei 29, criado em 2007 para estabelecer novas regras para o setor de TV por assinatura e produção de conteúdo audiovisual, e que até hoje tramita no Congresso, sofreu uma série de alterações. Ele ainda suscita muitas dúvidas e, na opinião do diretor de TV por Assinatura da SET, Antonio João Filho, vai produzir tanto benefícios quanto dificuldades. “O fim do limite de 30% de participação de capital estrangeiro em empresas de comunicação vai proporcionar a abertura para novos investimentos”, diz. Por outro lado, o cumprimento das cotas pode ser a maior dificuldade e colocar muitos canais na berlinda. Não resta dúvida, porém, que em termos de produção o mercado vai aquecer. Acompanhe.

Você pode explicar em linhas gerais o PL 29?
O PL29/2007 é um projeto de lei que cria novas regras para o setor de TV por assinatura e busca desenvolver sistemas de fomento para produção de conteúdo audiovisual no Brasil. O projeto foi concebido já há mais de três anos e sofreu inúmeras alterações desde o seu início de tramitação.

Na sua opinião, o PL 29 trará mais benefícios ou dificuldades para o setor de TV por assinatura?
Na verdade, vai acarretar as duas situações. Com relação aos benefícios, podemos destacar o fim do limite de até 30% de participação do capital estrangeiro em empresas de comunicação no Brasil, o que significa a abertura para mais investimentos, tanto em equipamentos quanto em produção propriamente dita. Com relação a dificuldades, teremos o cumprimento das cotas de carregamento de canais e regras de distribuição.

Como você vê o fato de a lei impor regras específicas para cada atividade da cadeia produtiva do setor – produção, programação, empacotamento e distribuição/ transporte?
O fomento à produção nacional para televisão é importante e muito bem recebido, mas a imposição de cotas, sem dúvida, vai acarretar o aumento dos custos de programação das empresas de TV por Assinatura. Como acontece nos diferentes setores da economia, em ocasiões similares, estes custos tendem a ser repassados ao consumidor, que será o maior prejudicado. As opções do consumidor também passam a ficar mais limitadas, uma vez que a lei determina cotas de carregamento por tipo de canal, horários de exibição, entre outras regras. Para cumprir estas cotas, canais deverão ser retirados da grade de programação e as regras de empacotamento ser alteradas, fazendo com que muitos assinantes fiquem insatisfeitos, afinal, eles terão seu poder de escolha limitado e vão acabar pagando mais caro para receber aqueles canais que eles escolheram.

Em que medida o PL 29 vai interferir com relação ao uso e desenvolvimento da tecnologia?
Acredito que não haverá qualquer tipo de interferência, pois com as tecnologias disponíveis sempre haverá como atender as demandas que surgirem. Quanto à quantidade de equipamentos utilizados para produção e distribuição de conteúdo a serem comercializados, aí sim poderemos ter um incremento importante.

Como vai evoluir a interatividade na TV por Assinatura e como se insere o Ginga nesse modelo?
A interatividade é limitada à capacidade de processamento dos terminais (set-top box) e no caso da TV por Assinatura a aplicação mais importante é o guia de programação, que é utilizado cada vez que o assinante muda de canal. Segundo pesquisas do setor, é a aplicação que 100% dos usuários aprovam e afirmam utilizar. As demais aplicações concorrem com notebooks, cada vez mais populares na sala de estar dos assinantes. Portanto, não faz sentido desenvolver aplicações complexas, que tornam o set-top box lento, se o cliente tem outros meios de acessar a informação. Quanto a adoção do Ginga pelo setor de TV por Assinatura, acredito que não acontecerá no curto-médio prazo, pois já existe um legado de milhões de set-top box instalados e gerando receita com outros middleware (OpenTV e NDS).

Como a exigência de produção e exibição mínima de conteúdo nacional, sobretudo no chamado horário nobre, pode prejudicar ou favorecer a indústria nacional?
Em termos de produção, o mercado sem dúvida irá aquecer, com os incentivos e a garantia de distribuição mínima para alguns programadores. A maior preocupação é com a qualidade das produções e o fato de haver determinação de horários para exibição. Se o programa ou canal é bom, naturalmente terá audiência.

Quais as implicações para o negócio com a liberação da atividade de distribuição para todo o tipo de operadora de telecomunicações?
Sem dúvida, haverá um crescimento da oferta de conteúdo pago para uma maior parte dos municípios brasileiros. Hoje em dia, temos cerca de 150 das 5.565 cidades brasileiras com serviço de cabo, enquanto que há assinantes de DTH em cerca de 4.000 municípios. Isto indica um grande interesse e potencial de negócios. Como as teles tem grande presença local com suas redes, certamente haverá um incremento de oferta, com mais competição e fomento de toda a cadeia de produção e distribuição.

Como se insere a SET e a sua diretoria nesse novo cenário?
A partir da popularização da TV por Assinatura, os técnicos e engenheiros terão cada vez mais responsabilidades e oportunidades de crescimento. Devemos estar atentos para atrair estes profissionais com benefícios para suas carreiras e desenvolvimento, a exemplo do que faz a SCTE (Society of Cable Telecommunications Engineers).

O que muda com o limite de propaganda a 25% do espaço por hora, como já é hoje na TV aberta?
A propaganda é uma receita importante para as programadoras, que na prática, em determinados horários, já veiculam percentuais muito próximos a estes ou até acima. Portanto, não haverá alteração, mas sim regulação dos índices.

Como você vê a disputa com as teles das freqüências na faixa de 2.5 GHz utilizadas pelo MMDS inclusive com consultas e audiências públicas?
Essa é uma questão delicada. De um lado, temos empresas que utilizam uma faixa de cerca de 200 MHz para distribuição de 31 canais analógicos de TV, o que é muito ineficiente hoje em dia. Há iniciativas de digitalização com economia de cerca de 3/4 deste espectro e o restante seria utilizado pelas empresas de MMDS para oferta de serviços de telecomunicações. Do outro, estão as empresas de telecom móveis que pagam muito por frações deste espectro e exigem isonomia de tratamento. O que esperamos é que as partes interessadas com a mediação da Anatel cheguem a uma decisão de equilíbrio.

*Roberto é editor da Revista da SET.
Revista da SET –  ANO XXI – N.112 – JAN/FEV 2010