PLANO AMERICANO DE BANDA LARGA : COMO ISSO PODE AFETAR A RADIODIFUSÃO BRASILEIRA ?

Por Ana Eliza Faria e Silva

Reconhecidamente a criação de uma infraestrutura de banda larga eficiente é um dos grandes desafios do século XXI não apenas no Brasil, mas para a grande maioria dos países. Em especial, a preocupação do Federal Communications Commission (FCC) com o desenvolvimento de um plano para permitir o acesso de todos à banda larga é a mesma que norteia diversas iniciativas do governo brasileiro, Ministério das Comunicações e ANATEL.

É papel dos governos propiciarem o desenvolvimento do ecossistema de banda larga, através do desenvolvimento de políticas de acesso, e a criação de incentivos à universalização. Nesse sentido, recentemente o FCC publicou um relatório contendo um grande número de ações para proteger e encorajar a competição de banda larga. Contudo, muitas delas são consideradas controversas pela extensão das iniciativas para reuso e compartilhamento do espectro, atualmente alocado à radiodifusão terrestre.

O plano americano de banda larga inclui o desenvolvimento de mecanismos para coletar, analisar e publicar informações detalhadas em cada mercado, sobre competição e preços de banda larga.

De forma muito positiva, os consumidores terão maior acesso à informações de preço e o desempenho, que são necessários para a escolha da melhor opção de banda do mercado. A transparência e o estabelecimento de regras claras também contribuem para assegurar a eficiência e a competição na prestação de serviços. O governo americano também prevê o financiamento de projetos de infraestrutura, reduzindo a barreira de entrada a novos competidores.

Porém, para atingir tais metas, o plano do FCC se apóia fundamentalmente em mudanças substanciais na atual alocação de espectro. Embora já existam freqüências destinadas para o uso de banda larga, isso é considerado pelo FCC como apenas uma fração da necessidade. A proposta inclui a alocação adicional de espectro para uso por equipamentos não licenciados, e a criação de incentivos para compartilhamento e uso flexível do espectro. O objetivo final é liberar 500 MHz para acesso banda larga ao longo dos próximos 10 anos, sendo que 300 MHZ deve ser disponibilizado para uso móvel ao longo dos próximos 5 anos.

Embora os detalhes sobre os mecanismos de realocação de 120 MHz, que correspondem a 20 canais de televisão do espectro de UHF, atualmente utilizado para a radiodifusão terrestre digital ainda não sejam conhecidos, a quantidade de recursos mobilizados e a velocidade sugerida para sua implementação assustam. Em seu discurso de abertura do NABShow 2010, Gordon Smith, presidente da NAB, destacou o plano de banda larga do FCC com um dos temas que mais despertam a atenção da entidade nos próximos anos. Para Gordon existe espectro livre fora da faixa das emissoras e que sua identificação poderia livrar freqüências sem empurrar a radiodifusão para fora do espectro, principalmente considerando que um quarto do espectro da radiodifusão foi devolvido ao regulador com o fim da transição para a TV digital.

A proposta em debate é um plano de liberação de porções contínuas de espectro através da devolução voluntária do canal por parte das emissoras, e realocação de freqüências das emissoras interessadas em continuar a ofertar TV digital. As devoluções de espectro serão financeiramente incentivadas. Assim, os leilões resultantes seriam compartilhados com emissoras que concordassem em devolver parte ou todo o espectro. Foi também aberta a possibilidade de continuidade da prestação de serviço, por compartilhamento de recursos entre emissoras, e conseqüente redução da qualidade de áudio e vídeo do sinal transmitido.

Através desse plano, o FCC pretende criar um mercado secundário com uso flexível de espectro, bem como incentivar o uso oportuno e não licenciado do espectro por novas tecnologias. Em seu discurso no NAB o chairman do FCC, Julius Genachowski, destacou que o processo será transparente e que as políticas de incentivo poderão incluir garantias de preço mínimo aos radiodifusores. De fato, como a liberação dessa porção do espectro se dará através de leilões públicos, é esperado que resulte em lucro suplantando os custos associados.

No Brasil o impacto de medidas similares seria muito maior dado o elevado percentual da população que tem na TV aberta a única forma de entretenimento e informação. Os brasileiros têm na TV aberta o mais importante veículo de inclusão social e digital e, ao contrário dos EUA, que já encerraram as transmissões de TV analógica, o processo de transição para a TV digital brasileiro, iniciado em 2007, apenas começa a avançar para o interior do Brasil.

Contudo, as deficiências e os desafios de infraestrutura também são grandes, cabendo aos reguladores buscar alternativas inovadoras, quanto ao uso eficiente do espectro, que não impeçam a radiodifusão de continuar a cumprir seu papel social; e que não diminuam a competitividade e a viabilidade econômica do setor.

 

Ana Eliza Faria e Silva é vice-diretora editorial da SET e gerente de tecnologias de transmissão da TV Globo – email: [email protected]