Jornalistas narram bastidores da tragédia ambiental de Brumadinho; Roberto Cabrini faz reflexão sobre tecnologia e futuro do jornalismo

As imagens marcantes dos primeiros momentos. A percepção da imensidão da tragédia. A cobrança das autoridades. As histórias daqueles que perderam um familiar ou participaram do resgate. A agilidade e a profundidade da cobertura jornalística do rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais, não seriam possíveis sem o uso da tecnologia.

 

Essa foi a conclusão de quatro dos maiores e mais respeitados jornalistas da TV brasileira, que se reuniram no painel “O jornalismo em campo: a transformação tecnológica e a eficiência operacional, a flexibilidade e a redução de custos” para contarem a experiência durante a cobertura da tragédia, que deixou 248 mortos (22 pessoas continuam desaparecidas). Os profissionais, com o uso de vídeos da cobertura, contaram os bastidores desse trabalho durante a palestra. O painel teve a moderação de Raimundo Lima, diretor de Tecnologia e Operações do SBT e diretor editorial da Revista SET.

 

A jornalista Carine Tavares, chefe de reportagem da Globo de Belo Horizonte, deu o tom do evento ao lembrar como o uso da tecnologia IP, em detrimento ao SNG, ajudou na cobertura jornalística de Brumadinho. “Só a tecnologia pode nos oferecer isso, tanto para nós, que queríamos mostrar em tempo hábil, como para o telespectador, porque era uma coisa realmente chocante para todos nós. Temos motivos para comemorar a evolução da tecnologia, que está ajudando o jornalismo, e um não vive mais sem o outro”, afirmou Carine.

 

Ao vivo

Eduardo Ribeiro, âncora do “Domingo Espetacular” e repórter especial da RecordTV, preparou uma surpresa para o público do congresso ao fazer um link para entrar ao vivo com Leonard Farah, capitão do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais. Segundo o capitão, 140 bombeiros ainda trabalham na busca das 22 pessoas desaparecidas. Questionado por Ribeiro, Farah falou da contribuição do trabalho de imprensa para os bombeiros: “Costumo dizer que você salvou minha vida, Edu. Fiquei praticamente três dias sem falar com minha esposa porque não tinha internet, e graças aos seus posts ao vivo ela tinha notícia sobre meu trabalho na lama. Hoje, a tecnologia permite que as informações sejam melhor divulgadas. Muitas vezes vocês, jornalistas, têm acesso a dados que nós, bombeiros, não temos, e isso é essencial para nosso trabalho.”

 

Ribeiro também falou sobre a “solidariedade” na cobertura de grandes tragédias. “Se para o telespectador médio as transmissoras são sempre concorrentes, em grandes coberturas, como esta, a gente descobre que a concorrência é apenas algo simbólico. Durante a cobertura eu não emprestei apenas um holofote, uma luz, uma lâmpada de outras emissoras, emprestei também o ombro de um cinegrafista de outras emissoras para usar a câmera, fazer um vídeo, passar um dado à frente”, exemplificou.

 

Márcio Campos, repórter do Jornal da Band, iniciou sua palestra contando algumas experiências profissionais que enfrentou quando a tecnologia ainda era insipiente na cobertura jornalística – como “grampear” orelhões para transmissão de futebol via rádio ou as dificuldades de se fazer um link em helicóptero -, até a chegada da tecnologia IP. “Isso deu uma agilidade inacreditável para a gente. Eu sou fã, gosto dessa vibração do jornalismo ao vivo, da notícia acontecendo naquele momento. E o que a tecnologia fez para colaborar nesse sentido é inacreditável”, declarou. E finalizou assim: “Do HT ao IP, vocês, profissionais da tecnologia, fazem deste profissional, do jornalismo de fôlego, um profissional realizado”.

 

Olhar humano

Roberto Cabrini, apresentador e editor-chefe do Conexão Repórter, do SBT, concluiu o painel com uma profunda reflexão sobre o papel da tecnologia no jornalismo e o futuro da profissão. Afirmou que muitos “profetas do apocalipse” têm previsto o final da profissão de jornalista. “Estamos em uma época na qual máquinas escrevem textos surpreendentemente concisos, até competitivos, e essas mudanças têm causado a demissão de seres humanos. E hoje, aquilo que a gente faz é contestado em tempo real pelo telespectador. Mais do que isso, o telespectador transformou-se em um repórter em potencial, podendo contestar uma matéria, por exemplo”.

 

Em uma mensagem voltada a todos os colegas de profissão, Cabrini pediu para que se atenham ao que chamou de mais importante nesse trabalho: “Conclamo todos vocês a não perderem o olhar humano. Não permitam que a tecnologia nos torne seres mais distantes, mais arrogantes. A grande história vale com um grande aparato tecnológico ou com uma câmera lambe-lambe. A tecnologia não define uma grande cobertura, ela facilita e dá agilidade. O que define uma grande cobertura é o olhar humano. Não percam jamais de perspectiva essa necessidade que temos de estar em sintonia com o ser humano, com o cidadão comum. Em um momento de grande transformação social, de incertezas, não podemos nos afastar dos anseios dessas pessoas quando a gente faz jornalismo”, concluiu Cabrini.